O Coritiba precisou enfrentar lendas do futebol do brasileiro e mundial antes de chegar ao Maracanã e conquistar, 40 anos atrás, o título do Campeonato Brasileiro de 1985, na final diante do Bangu.
O experiente técnico Zagallo e o ainda novato Geninho, por exemplo, entraram no caminho do Coxa até a conquista, assim como as então promessas ofensivas Romário e Casagrande, além do volante Dunga, que nove anos depois seria o campeão do tetracampeonato com a seleção brasileira.
Relembre como foi a campanha coxa-branca até a glória do primeiro título nacional de um clube paranaense.
Taça de Ouro tinha 44 times e fórmula diferente
Em 1985, o atual Brasileirão era chamado de Taça de Ouro. Os 44 clubes eram divididos em quatro grupos (A, B, C e D). Na primeira fase, 20 clubes foram divididos nos grupos A e B. Eles jogavam dois turnos, sendo que cada clube enfrentava apenas os times da outra chave.
Quatro equipes se classificavam: o vencedor do primeiro turno, o vencedor do segundo turno e os dois times melhores classificados na soma dos dois turnos.
O Coritiba ficou no Grupo A, com América-RJ, Atlético Mineiro, Botafogo, Corinthians, Fluminense, Grêmio, Guarani, Palmeiras e Santa Cruz.
Já no Grupo B estavam Bahia, Cruzeiro, Flamengo, Goiás, Internacional, Náutico, Santos, São Paulo e Vasco da Gama. Todos esses foram adversários do Coxa.
Coritiba teve Índio artilheiro, em que foi “explodido” por Roberto Dinamite na estreia de Romário

O Coxa ficou em oitavo lugar no primeiro turno do Grupo A. A estreia foi com uma vitória por 3 a 1 sobre o São Paulo. O meia Toby abriu o placar e o atacante Índio marcou duas vezes, enquanto Sidney descontou pelos paulistas.

Depois disso, a vítima alviverde foi o Cruzeiro. Triunfo por 2 a 1. Índio marcou outro doblete, sendo que Tostão, que viria a defender o Coxa na temporada seguinte, marcou pela Raposa.
A partir daí, as coisas desandaram. Em Salvador, o Coritiba abriu o placar com mais um gol de Índio, mas levou a virada do Bahia por 2 a 1, com gols de Robson e Mazinho.
Depois disso, veio a derrota por 3 a 0 para o Vasco da Gama, com dois gols de Roberto Dinamite e um do meio campista Vitor. O detalhe é que o jovem Romário entrou no segundo tempo daquela partida. O Baixinho saiu do banco aos 13 minutos e fez a estreia no time profissional, mas não balançou as redes alviverdes.
Na capa do Jornal dos Sports, um dos principais veículos de comunicação daquela época, estampou a capa no dia seguinte com a manchete: “Dinamite explode o Coritiba: 3 a 0”.
Coxa perdeu técnico para seleção do Oriente Médio
O revés também foi um marco pela saída do então técnico Dino Sani, um dos principais responsáveis pela montagem do elenco. O ex-meia, que chegou a jogar pelo Boca Juniors e o Milan, da Itália, na década de 60, aceitou a proposta para trabalhar no Oriente Médio e ser o técnico da seleção do Catar. Tudo isso após pouco mais de 15 dias do início da Taça de Ouro.
O que pouca gente lembra que é Dino, além de ter sido um atleta consagrado, também foi treinador do Flamengo em 1981, ano em que o clube carioca foi campeão mundial sob comando de Paulo César Carpegiani. Antes de parar no Coxa, ele também treinou Internacional e Fluminense.
E detalhe: Dino Sani é o campeão mundial mais velho vivo desde a morte de Zagallo. Ele foi campeão mundial em 1958 e hoje está com 93 anos.
Ou seja, de alguma forma, a saída de Dino Sani também foi fundamental para a conquista do Coritiba em 1985.
Dirceu Krüger foi o responsável por ser o técnico interino no empate por 0 a 0 com o Goiás, no Couto Pereira. Ele fez a transição para a chegada de Ênio Andrade, que chegou com moral por ter conquistado títulos nacionais com o Internacional e o Grêmio. Porém, o sucesso não foi de imediato no Alto da Glória.

Coxa também encontrou Zagallo com esquadrão do Flamengo e Geninho, no início de carreira, no primeiro turno

A estreia de Ênio foi com uma derrota por 1 a 0 para o Flamengo, comandado por Mário Jorge Lobo Zagallo. O esquadrão carioca não tinha o retorno de Zico aquela altura, mas contava com uma escrete com Jorginho, Leandro, Mozer, Adalberto, Andrade e Adílio.

O revés diante do Flamengo antecedeu mais duas derrotas. O Coritiba foi atropelado e levou um sonoro 4 a 0 do Internacional. Os gols foram de Luís Freire, duas vezes, Silvinho e Jussiê.
Depois, a Portuguesa venceu o Coxa por 1 a 0, com gol de Luís Pereira.
O Coritiba só voltou a vencer contra o Naútico. Édson e Índio anotaram os gols do 2 a 0 no primeiro triunfo de Ênio no comando alviverde, que encerrou o primeiro turno.

No entanto, o clube do Alto da Glória perdeu de novo na última rodada da primeira fase: 1 a 0 para o Santos. O gol foi de Formiga, em jogo que Índio foi expulso e que o Peixe era comandado por Geninho no início da carreira como treinador. 16 anos depois, o técnico viria a conquistar o Campeonato Brasileiro de 2001, no primeiro título nacional do Athletico.
Lela salvou o Coxa, que triunfou no Maracanã antes da final de 1985

No segundo turno, os adversários foram os mesmos com a mudança nos mandos de campo. Apesar de Índio seguir marcando, Lela se tornou o grande salvador alviverde.
No Morumbi, o Coritiba venceu o São Paulo novamente, dessa vez por 1 a 0. O gol foi do zagueiro Heraldo. Já no Mineirão, o Coritiba venceu o Cruzeiro por 3 a 2. Carlinhos Sabiá, que viria a ter destaque no Athletico, e Dedé de Dora anotaram pelo time celeste, mas Paulinho e Índio, com dois gols no final, garantiram o triunfo alviverde.
No entanto, o Bahia voltou a ser algoz e venceu o Coxa por 2 a 1 no Couto Pereira. Lela anotou pelo Alviverde, enquanto Leandro e Celso, aos 44 minutos do segundo tempo, definiram o marcador.
Já no reencontro com o Vasco, o placar ficou no 0 a 0 em Curitiba. Roberto Dinamite não esteve em campo, mas Romário voltou a entrar no segundo tempo.

Fora de casa, o Coritiba venceu o Goiás por 2 a 0, com gols de Vicente, que saiu do banco de reservas por lesão de Édson aos 20 minutos, e Lela.
Em uma sequência como visitante, o Coxa deu o troco no Flamengo e triunfou por 1 a 0. Com gol do volante Marildo, o clube do Alto da Glória surpreendeu o tímido público de 15 mil pessoas. “Salto alto derruba o Mengo no Maracanã”, manchetou o Jornal dos Sports no dia seguinte.
Depois disso, o time de Ênio de Andrade ficou no 0 a 0 com o Internacional e perdeu por 2 a 0 para a Portuguesa, de novo. Gols de Jones e Toninho no Alto da Glória.
Um novo revés por 2 a 0 para o Náutico, com gols de Baiano e Neto Surubim, antecedeu a grande decisão para o Coxa.
O Coritiba lutava com o Fluminense pelo primeiro lugar do grupo e precisava vencer para se classificar. Enquanto os paranaenses enfrentavam o Santos, de Geninho, o Flu encarava o Bahia, que derrotou o Coxa nos dois turnos. Os baianos fizeram mais um bom jogo, mas perderam para os cariocas graças ao gol de Washington, que também viria a fazer história no futebol paranaense.
Já que os jogos da última rodada eram simultâneos, a torcida do Fluminense comemorou a classificação por 10 minutos. Foi o tempo que levou para o Coritiba vencer por 2 a 1, com gol salvador de Lela aos 45 minutos do segundo tempo. Vavá tinha aberto o placar pelo Alviverde, enquanto Márcio Rossini tinha igualado.
Detalhe é que o Coxa ficou em sétimo lugar na posição geral. Mas como a regra classificava o campeão de turno e returno, o Coxa avançou de fase e seguiu vivo na competição.
Segunda fase: Coxa superou o Corinthians de Casagrande, Chulapa e Dunga

Os 16 classificados da primeira fase (quatro de cada Grupo) foram reorganizados em novos quatro grupos — E, F, G e H.
O Coritiba caiu no Grupo G e enfrentou Corinthians, um dos favoritos ao título, Sport e Joinville.
Em nova disputa por turno e returno, classificavam-se os líderes de cada grupo. Ou seja, os quatro líderes iriam para a semifinal.
No primeiro jogo, o Coxa segurou o empate por 1 a 1 com Sport na Ilha do Recife. Milton Cruz abriu o placar pelo Leão, mas Marildo igualou tudo.
Já no duelo do primeiro turno contra o Corinthians, o jogo foi quente. Os meias Toby e Walter Casagrande, comentarista esportivo, foram expulsos. No placar, vitória alviverde por 1 a 0 com gol dele: Lela. Os paulistas ainda tinham o volante Dunga e o atacante Serginho Chulapa na equipe derrotada.

“Almir colou em Casagrande a ponto de perturbar o craque até sua expulsão”, noticiou o Correio de Notícias. Antes disso, a Gazeta do Povo já tinha alertado a estratégia de Almir. “Vou marcá-lo em cima que nem carrapato. Não quero nem saber se ele é da seleção brasileira”, avisou o volante alviverde.

Com moral, o Coxa também triunfou sobre o Joinville: 2 a 1, com gols de Dida e Lela. Reginaldo descontou pelos catarinenses.
No returno, o time alviverde começou com a única derrota da segunda fase. O Corinthians venceu o Coritiba por 1 a 0, com gol de Wladimir. Detalhe: o jogo teve três expulsões. Édson Boaro e Dicão receberam o cartão vermelho pelos paulistas, enquanto Heraldo foi para o vestiário alviverde mais cedo.
O resultado que encaminhou bem a classificação foi a vitória por 1 a 0, fora de casa, sobre o Joinville. Lela anotou o gol que fez o Coxa depender de um empate para avançar. “Careta de Lela deixa o Coritiba com um pé na semifinal”, manchetou a Gazeta do Povo.
E assim aconteceu: o empate por 0 a 0 diante do Sport assegurou a liderança e colocou os dois pés do Coritiba entre os quatro melhores clubes do Brasil.
Bichos aos atletas: diretoria deu gás pela liderança e classificação
No dia 22 de julho de 1985, a Gazeta do Povo noticiou os valores de premiação dados aos jogadores pela classificação à semifinal da Taça de Ouro.
“A classificação do Coritiba para a semifinal da Taça de Ouro encheu o bolso dos jogadores. Um prêmio de 72 milhões de cruzeiros (o equivalente a R$ 120 mil) foi anunciado pela diretoria pela classificação entre os quatro melhores times do país. Na mesma paulada, a diretoria pagou o bicho pela vitória por 1 a 0 sobre o Joinville, de 600 mil cruzeiros (R$ 1 mil)”, publicou o jornal.
Antes disso, a diretoria de Evangelino da Costa Neves já tinha pago outros valores. “Na véspera do jogo com o Joinville, a diretoria foi ao Beco do Sossego (concentração anexa ao Couto Pereira) e pagou aos jogadores os bichos do empate com o Sport e da vitória sobre o Corinthians. Um prêmio de 1,6 milhão de cruzeiros (R$ 2,7 mil)”.
Para completar, o Coxa teria três desfalques de peso para a semi: o goleiro Rafael, o volante Marildo e o atacante Lela, todos suspensos pelo terceiro cartão amarelo. Dessa forma, Jairo voltaria a assumir a titularidade na meta coxa-branca.
“Quis o destino que o mais importante goleiro da história do Coritiba assumisse as traves justamente em um jogo decisivo da campanha da Taça de Ouro (…) O Coritiba ainda escapou de um quinto desfalque. Toby foi julgado pela expulsão contra o Corinthians. Pegou apenas um jogo, já cumprido”, noticiou a Gazeta.
“Graças a Deus podemos contar com um goleiro do nível do negão. É um dos grandes goleiros do país”, disse Rafael sobre o reserva.
Coritiba bateu esquadrão do Atlético-MG na semifinal

O Coritiba encarou o Atlético Mineiro, líder do Grupo E, sendo que os mineiros tinham a vantagem, por terem a melhor campanha na competição, de vencer e perder pela mesma diferença de gols. Na outra semi, o Brasil de Pelotas, primeiro colocado do Grupo F, pegou o Bangu, que terminou na liderança do Grupo H. Foram disputados jogos de ida e volta.
No primeiro jogo entre Coxa e Galo, os alviverdes venceram por 1 a 0 em um duelo marcado por uma queda de energia no estádio Couto Pereira. Quando a luz voltou, após cerca de 20 minutos de blecaute o gol foi do zagueiro Heraldo, que garantiu a vantagem sobre um dos grandes times da história do clube mineiro.
Além do atacante Reinaldo, mais conhecido como Rei para a torcida alvinegra, o time contava com o goleiro João Leite, Luizinho, Nelinho e Paulo Isidoro.

Mesmo com os nomes que marcaram uma geração, o Galo não conseguiu marcar um gol no goleiro Rafael, que virou santo. Em um duelo de ataque contra defesa, o Coxa abdicou de qualquer tentativa ofensiva e se segurou como deu. E conseguiu. No lance mais difícil, polêmico para muitos torcedores até hoje, o arqueiro do Coxa salvou uma bola em cima da linha. Para muitos atleticanos, claro, a bola entrou. Não para o juiz Luiz Carlos Félix, que era Rio de Janeiro, e muito menos para os coxa-brancas.
Fato é que o Coritiba segurou o Atlético-MG em um Mineirão com pouco mais de 64 mil pessoas. Aquele resultado deu confiança e também uma vaga na Libertadores de 1986 para o clube do Alto da Glória.

Final
Em jogo único, a decisão foi realizada no Maracanã. Sem tanta expressão como os outros clubes do Rio de Janeiro, vários torcedores de Flamengo, Botafogo, Vasco e Fluminense foram ao estádio.
Em um empate por 1 a 1, com gols de Índio e Lulinha, a decisão foi nos pênaltis.
Índio, Marco Aurélio, Édson, Lela, Vavá e Gomes anotaram as seis cobranças alviverdes. O título foi sacramentado com o erro de Ado Souza, o sexto cobrador do Bangu.
Jogos do Coritiba na Taça de Ouro de 1985, o primeiro título do Campeonato Brasileiro do Coxa
Primeira fase dos Grupos A e B
- Coritiba 3 x 1 São Paulo – 27/01/1985
- Coritiba 2 x 1 Cruzeiro – 31/01/1985
- Bahia 2 x 1 Coritiba – 03/02/1985
- Vasco 3 x 0 Coritiba – 06/02/1985
- Coritiba 0 x 0 Goiás – 10/02/1985
- Coritiba 0 x 1 Flamengo – 13/02/1985
- Internacional 4 x 0 Coritiba – 23/02/1985
- Portuguesa 1 x 0 Coritiba – 27/02/1985
- Coritiba 2 x 0 Náutico – 03/03/1985
- Santos 1 x 0 Coritiba – 06/03/1985
Início do returno – vencido pelo Coritiba, o que classificou o time
- São Paulo 0 x 1 Coritiba – 09/03/1985
- Cruzeiro 2 x 3 Coritiba – 13/03/1985
- Coritiba 1 x 2 Bahia – 17/03/1985
- Coritiba 0 x 0 Vasco – 20/03/1985
- Goiás 0 x 2 Coritiba – 24/03/1985
- Flamengo 0 x 1 Coritiba – 27/03/1985
- Coritiba 0 x 0 Internacional – 31/03/1985
- Coritiba 0 x 2 Portuguesa – 07/04/1985
- Náutico 2 x 0 Coritiba – 10/04/1985
- Coritiba 2 x 1 Santos – 14/04/1985
Segunda fase
- Sport 1 x 1 Coritiba – 03/07/1985
- Coritiba 1 x 0 Corinthians – 07/07/1985
- Coritiba 2 x 1 Joinville – 10/07/1985
- Corinthians 1 x 0 Coritiba – 13/07/1985
- Joinville 0 x 1 Coritiba – 17/07/1985
- Coritiba 0 x 0 Sport – 21/07/1985
Semifinal
- Coritiba 1 x 0 Atlético-MG – 24/07/1985
- Atlético-MG 0 x 0 Coritiba – 28/07/1985
Final
- Bangu 1 (5) x (6) 1 Coritiba – 31/08/1985